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quarta-feira, 26 de março de 2014

A complexidade e a criatividade transformam os currículos educativos

Qualquer projeto de conhecimento deve ser ao mesmo tempo  projeto de conhecimento do conhecimento, a Complexidade inspira uma série de sugestões  meta-paradigmáticas para orientar o educador-designer de programas educacionais e, conferir marcos ao planejamento de uma estratégia mais flexível e integradora da organização dos conteúdos curriculares. Por Nicolás Malinowski.

Tradicionalmente, e desde a formação inicial até os níveis mais avançados, a questão dos conteúdos educacionais é organizado de uma forma linear: cada semestre ou trimestre representa uma coluna, e o estudante passa assim sucessivamente por uma etapa, através da sanção dos exames, até o final da sua trajetória de estudos.

Esta realidade não é monopólio de nenhuma área disciplinar em particular, mas sim herança de modelos cognoscitivos fundadores do pensamento moderno. O filósofo e sociólogo Auguste Comte, durante a primeira metade do século XIX, forneceu as bases doutrinais do positivismo, entendido como a fé no progresso contínuo da ciência e, conseqüentemente, da humanidade - ao mesmo tempo que a necessidade metodológica de uma disjunção disciplinar pensada como natural: "Uma disciplina se define completamente por seu objeto positivo e seu método de investigação" (1)


A forma de aquisição de conhecimento tem, portanto, evoluído, desde as bases de seu paradigma cartesiano-positivista dominante há mais de dois séculos, e tão intimamente associado com a ciência e a tecnologia baseada na ideia  hiperparcelação dos objetos de estudo.


Os problemas considerados e as soluções propostas são cada vez mais artificialmente simples e, consequentemente, não somos capazes de resolver os problemas mais fundamentais da humanidade, mais complexos e globais, para gerar formas muito perversas de condicionamento intelectual. (2)


Nesta perspectiva clássica, o currículo tende a ser concebido como uma metodologia própria às ciências da educação, contando com um propósito prévio e uma série de passos estruturados, mecânicos para obtê-lo.

La complejidad y la creatividad transforman los currículos educativos

Do planejamento educativo ao desenho estratégico
 

Hoje, se as sociedades parecem incapazes de lidar com problemas globais fundamentais (meio ambiente, Geopolítica, Direitos Humanos ...), é porque um déficit da inteligibilidade aparece claramente em um mundo onde as interdependências de todos os tipos aumentam, induzindo um processo rápido de obsolescência dos nossos quadros de pensamento e nossos conhecimentos técnicos, das nossas instituições e dos nossos métodos de gestão. 

A Transdisciplinaridade induzida pela complexidade, permite teoricamente superar as simplificações de uma ciência muito ainda caracterizada pelo determinismo e pelo positivismo. Postular uma realidade que se impõe aos olhos do pesquisador e observador do mundo ao redor é, provavelmente, o primeiro erro intelectual para a produção e organização do conhecimento. 


Esta realidade só existe no olhar que colocamos sobre ela. Portanto, o conhecimento aparece como um produto objetivado, e tampouco objetivo, entre o que quer conhecer e incluir e o fenômeno observado cuja existência se supõe. A questão da ética do conhecimento torna-se central, liberando-se de marais pragmáticas ou políticas, e reafirmando - triunfalmente - o papel central do ser pensante na construção dos conhecimentos.


A criatividade, bem como a aptidão para encontrar soluções novas relacionando dados conhecidos, revela aqui uma qualidade essencial, mas o mais ambíguo como atributo do planejador educacional que justamente escapa a suas tentativas de racionalização e sistematização.

Mais do que um contra - método curricular verdadeiro - que implicaria a formulação simétrica de um corpus  de regras opostas ao cartesianismo em seus conteúdos, mas convergentes com ele em seu caráter intrisincamente prescritivo - a complexidade  parece mais bem convidar para repensar a noção mesma de prescrição metodológica, a repensar a nossa própria confiança no ideal de certeza e elaborar abordagens científicas como fundamentalmente aventura não-linear. (3)


O poeta espanhol Antonio Machado expressa de maneira inimitável com estes famosos versos, nos quais se hão identificados muitos pensadores da complexidade:


"Caminhante, seus passos são o caminho, e nada mais;caminhante, não há caminho, se faz caminho ao andar.

Ao andar se faz caminho, e ao olhar para trás vê-se o caminho que nunca se há de voltar a pisar.
Caminhante, não há caminho, mas estrelas no mar." (4)

Como representar graficamente um currículo integrador? 

Nesta óptica e de acordo com Carlos Alberto Botero (2008), a noção de " eixos transversais" consistiriam em pensar temáticas que atravessam, vinculam e conectam várias disciplinas do currículo considerado, convertendo-se em dinâmicas internas de integração curricular.

Simetricamente para nós, se trata, desde uma visão sinóptica do projeto curricular, de permitir a construção destas dinâmicas internas, com um duplo instrumento dos "núcleos programáticos" e das "pontes integradoras".


A escolha e definição das ferramentas transversais é baseada em três dinâmicas, lógica e cronologicamente relacionadas:


• Em primeiro lugar, a assegurar uma boa compreensão e apropriação dos eixos cardeais do modelo educacional vigente na instituição em causa, como uma representação arquetípica do processo de ensino e aprendizagem, o que implica uma concepção subjacente de educação, aprendizagem, do aluno e  da docência mesma.


Esta etapa pode parecer óbvio, é no entanto crucial como bem sugere Ralph Tyler, insistindo que seu famoso Estudo dos Oito Anos, na necessidade de definir metas que sejam bem impregnados em todo o sistema em que está imerso a instituição.


• Em seguida, a análise detalhada e exaustiva dos assuntos abordados pelo currículo considerado, e dos conteúdos bordados contido em cada um, a fim de identificar, a partir de um ponto sistêmico de análise, as conexões temáticas que surgem a priori entre  todos esses assuntos. Graficamente, o primeiro estágio pode então ser resumido como se segue
:

La complejidad y la creatividad transforman los currículos educativos
Esta identificação de unidades temáticas é, por definição, um ato criativo, por sua irredutibilidade à aplicação mecânica de um quadro metodológico pré-definido. Trata-se, concretamente, de uma dinâmica consciente de reapropriação conceitual a partir da qual se lança uma ideia, uma noção, um conceito não diretamente incluído na lista de temas da assinatura considerada, mas que emerge de sua estrutura geral. 

• Com base nisso, um terceiro passo, muito importante, consistirá em dar  volta ao esquema acima para passar de uma definição de temas por cursos para uma definição  de cursos por temas: 


A ponte integradora consiste assim em um núcleo problemático que deixa de ser isolado (e não apenas no nível de  um assunto, mas como uma ocorrência global) a ser proposto como vínculo de conceitual possível entre as diferentes disciplinas curriculares consideradas. 


• Cada par representa uma ponte integradora potencial.

La complejidad y la creatividad transforman los currículos educativos
Esta dinâmica de identificação  dos problemas fundamentais é, por definição, um ato criativo, artístico,  por sua irredutibilidade à aplicação mecânica de um esquema metodológico pré-definido. Neste sentido, é difícil julgar, a priori, a relevância de uma proposta de ponte  integradora, mas podemos no entanto propor dois marcos racionais de base:

- Um tema integrador, primeiro, que reúna todas as disciplinas do currículo, deixa de ser um tema integrador para tornar-se uma característica do modelo educacional.

- Ao contrário de um tema integrador que só consta com uma disciplina imediatamente perde o seu potencial de ligação.

Isto nos convida a conceber as disciplinas,  não da forma tradicionalmente hierárquica,  como poderia definir um Auguste Comte - mas como constelação de pontos, ou arquipélagos temáticos (5), reunidos em função de objetivos pedagógicos transversais. Estes objetivos permitem  não pensar o currículo global como justaposição de nós separados, mas como um sistema de relações entre objetivos fortes, e com um grau crescente de complexidade:
La complejidad y la creatividad transforman los currículos educativos
Conclusão: Algumas pistas de operacionalização

As potenciais vantagens deste modelo de currículo integrador podem ser consideradas a partir de várias perspectivas:

*Orientar de forma mais clara a escolha de especialidades e disciplinas optativas.
* Adquirir habilidades de inteligência estratégica que permitam resolver de maneira eficiente e responsável os desafios complexos.
* Proporcionar ao aluno uma melhor apropriação de sua trajetória de estudos...

Desde a sua fundação em 2004, no México, é uma das linhas de investigação na qual tem trabalhado os membros do grupo de professores e pesquisadores da Multiversidad Edgar Morin para a revisão curricular e o desenho de programas concebidos a partir da perspectiva da transdisciplinaridade.

Em 2008, tivemos a grande honra de sermos convidados pela Secretaria Federal de Segurança Pública (SSP) e de Desenvolvimento do Banco Interamericano de Desenvolvimento a participar do projeto "Plano Reitor de Profissionalização das Carreiras de Polícia", no México, por um esforço de reorganização curricular como descrito acima, com busca e construção de pontes integradoras.

Independentemente das considerações em termos de contextualização e derivações do projeto, seu ponto de partida como tal, que é o interesse demonstrado pelos responsáveis ​​do Departamento de Formação da SSP com a proposta do pensamento complexo e transdisciplinar, já nos aparece como resultado profundamente estimulante, intelectualmente falando, revelador de mudanças globais e profundos em termos de formas de pensar sobre a atividade humana na sociedade.

Notas

(1) A. Comte (1828): Discours sur l´Esprit Positif, Paris, Edit. PUF.
(2) E. Morin (2011): Las Noches Están Preñadas y Nadie Conoce el Día Que Nacerá, Le Monde - Artículo publicado en la edición de 09.01.11, Paris: "La insolvencia del pensamiento enseñado por doquier, que separa y compartimenta los conocimientos sin poderlos reunir para afrontar los problemas globales fundamentales, se hace sentir, más que en cualquier otro terreno, en la política. De ahí una ceguera generalizada, tanto más cuanto que se cree poder disponer de las ventajas de una “sociedad del conocimiento”.
(3) E. Morin (1994): El Empeño Multidimensional, Sociología, México, Anthropos Editorial, 2003, p 193: “Se trata, en pocas palabras, de encontrar el rigor, no la rigidez, pero dentro de una estrategia de permanente adaptación.”
(4) A. Machado (1917): Poema XXIX de Proverbios y Cantares, Campos de Castilla, Alianza Editorial S.A, 2006.
(5) E. Morin (1999): Los Siete Saberes Necesarios para la Educación del Futuro, Paris, UNESCO, p: “El conocimiento es una navegación en un océano de incertidumbre, a través de archipiélagos de certeza.”

Nicolas Malinowski é Diretor Acadêmico de Multiversidad “Mundo Real” Edgar MorinCoordenador do Diploma em Desenvolvimento de Modelos CurricularesArtigo derivado do libro de E. del Percio (dir) & N. Malinowski (2010): "Prejuicio, Crimen y Castigo", Editorial Sudamericana S.A., Buenos Aires, Argentina.

Retirado de Tendências21.net

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