O Brasil está passando por uma ampla transição na composição demográfica de suas filiações religiosas, com mudança de hegemonia entre católicos e evangélicos e o aumento da pluralidade, o que se observa para o conjunto da população, mas também entre a população indígena.
Existem diversas limitações de dados e de estudos de longo prazo para se compreender com profundidade a dinâmica sociodemográfica dos povos indígenas do Brasil. Se essa afirmativa é válida para a população indígena como um todo, é ainda mais em face da diversidade cultural das muitas etnias que compõem esta população – falantes de múltiplas línguas – distribuídos entre as áreas rurais e urbanas de todo território nacional.
O artigo “Cambios en el perfil religioso de la población indígena del Brasil entre 1991 y 2010” (Alves et. al. 2017), publicado na revista Notas de Población, da Cepal (n. 104, jan-jun 2017) analisa as mudanças religiosas que ocorrem entre os indígenas no Brasil, entre 1991 e 2010, de forma contextualizada, com base nos microdados dos Censos Demográficos.
Segundo os dados censitários, os católicos que apesar de serem o grupo majoritário e menos heterogêneo, apresentam tendências declinantes, enquanto, os evangélicos que possuem grande heterogeneidade, apresentam crescimento contínuo. Também houve aumento das outras denominações e daquelas pessoas que se declaram sem religião. Evidentemente, esta transição religiosa tem ritmo e motivações diferenciadas nos diversos segmentos populacionais.
A análise detalhada dos dados das duas últimas décadas certamente contribui na compreensão da dinâmica religiosa e nas alterações quantitativas entre o percentual de católicos e evangélicos – os dois maiores grupos religiosos – no contexto da pluralidade e da diversidade cultural dos povos nativos do Brasil. Embora estes números mostrem alguma semelhança com a distribuição verificada na população não indígena, nota-se uma maior pluralidade religiosa entre os povos indígenas. Também a razão de evangélicos sobre católicos (REC) é maior entre os indígenas do que entre a população não-indígena nacional.
O contraste mais acentuado ocorre nas áreas rurais (onde moram a maior parte da população indígena e a menor parte da população não-indígena). Na região Norte, que tem o maior número de indígenas, a REC passou de 20% para 60%, isto quer dizer que havia 20 índios evangélicos para cada 100 índios católicos em 1991, passando para 60 índios evangélicos para cada 100 católicos em 2010.
Mas a transformação mais marcante ocorreu na região Centro-Oeste, que tem a segunda maior população indígena e onde a REC passou de cerca de 45% em 1991 para cerca de 90% em 2010. No estado do Mato Grosso do Sul, os evangélicos já ultrapassaram os católicos entre os indígenas, pois a REC passou de 68% em 1991 para 146% em 2010. Não por coincidência, em 1912, foi no atual Mato Grosso do Sul que ocorreu a evangelização dos índios Terenas, considerada a primeira conversão evangélica do Brasil. E foi também entre os Terenas que foi construída a primeira igreja evangélica.
A pluralidade religiosa também foi maior entre a população indígena jovem como revelou a análise dos dados da estrutura etária. Assim, a dinâmica geracional indica que as filiações católicas devem continuar caindo. Destaca-se ainda que a soma das religiões cristãs (católicos e evangélicos) tinha um peso relativamente menor entre a população indígena do que na população total do Brasil.
O artigo “Cambios en el perfil religioso de la población indígena del Brasil entre 1991 y 2010” traz uma análise histórica sobre a transição religiosa entre a população indígena no Brasil e apresenta um quadro estatístico das mudanças ocorridas entre 1991 e 2010 nas regiões e municípios brasileiros. O artigo pode ser acessado livremente no link abaixo.
Referência:
ALVES, JED et. al. Cambios en el perfil religioso de la población indígena del Brasil entre 1991 y 2010, CEPAL, CELADE, Notas de Población N° 104, enero-junio de 2017, pp: 237-261
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 06/09/2017
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