Carlos Novaes, 25 de outubro de 2017
Faz poucos dias, escrevi aqui um post em que mais torcia do que analisava — só depois me dei conta desse erro. O lavar de mãos de Maia, desmentido até pelo pai dele, logo se mostrou uma jogadinha para aumentar o próprio cacife do presidente da Câmara junto ao golpista.
Temer acaba de, mais uma vez, derrotar a sociedade brasileira com apoio da Câmara Federal. Não houve qualquer chance de minhas esperanças serem recompensadas.
Temer seguirá refém dos que apoiaram sua permanência no cargo. Mas eles não devem ser chamados de “base governista”. Não há propriamente governo. Essa inédita solda entre Executivo e Legislativo se dá precisamente porque Temer abriu mão de governar. Quem acompanha este blog já leu posts em que analisei a fratura que vejo entre o Executivo e o Legislativo no Brasil, e suas implicações para a chamada governabilidade. Essa contradição se dá porque o presidente da República (mesmo o menos apegado à ideia de realizar mudanças em benefício do povo) é empurrado pelos compromissos eleitorais e entra em choque com um parlamento comprometido com a desigualdade.
Como Temer não passou pelo voto, que é o vínculo do presidente com a sociedade; como Temer, por isso mesmo, não apenas se jacta de propor “reformas impopulares”, mas faz da propaganda delas uma cortina de fumaça para baixar medidas danosas ao país em matérias (mineração, proteção ambiental, trabalho escravo, perdão de dívidas empresariais etc) que sequer foram mencionadas no debate pífio das reformas; como Temer nada mais faz do que atender às demandas das maiorias facciosas que se formam no Congresso em torno desse ou daquele interesse; por tudo isso, ficou fácil “abolir” a fratura entre o Executivo e o Legislativo. A sociedade simplesmente não é levada em conta na hora de decidir como conduzir esse Estado de Direito Autoritário que, por isso mesmo, se encontra numa crise de legitimação. Ou seja:
- diante da impossibilidade de governar com este Congresso
- diante da necessidade e do compromisso de atender ao apetite dos congressistas profissionais sem contrariar os interesses dos grandões do mercado
- aboliram a governabilidade e, assim, deram cabo da fratura entre Executivo e Legislativo
Gilmar Mendes, membro falante da facção hoje majoritária no jogo político-institucional brasileiro, enxerga na atuação da Câmara um sinal de “maturidade institucional” — é como se a manutenção do quadro atual fosse sinal de estabilidade; como se o papel das pessoas responsáveis fosse evitar fazer marola; como se as crises que estamos a viver pudessem ser superadas por este governo, por esta dinâmica institucional. Gilmar vê no atual conluio entre Temer e o Congresso o oportuno “parlamentarismo de ocasião” celebrado por Delfim Neto tempos atrás. Aliás, diante dessa verdadeira fusão entre o Executivo e o Legislativo, só inocentes ou mal intencionados podem deixar de ver o quão danosa seria a adoção do parlamentarismo entre nós.
Enfim, como dito quando da vitória de Temer na votação da primeira denúncia da PGR, tudo ficará, mesmo, para 2018, pois a última flecha de Janot deu n’água.
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