UM DIA, PEDRO MALASARTES FOI TER com o rei e lhe pediu três botijas
de azeite, prometendo-lhe levar em troca três mulatas moças e
bonitas. O rei aceitou o negócio. Pedro saiu e foi ter à casa de uma
velha ali pela noitinha; pediu-lhe um rancho, e que lhe botasse as
botijas no poleiro das galinhas. A velha concordou com tudo. Alta
noite, Pedro Malasartes levantou-se, foi de pontinha de pé ao poleiro,
quebrou as botijas, derramou o azeite, lambuzando as galinhas. De
manhã muito cedo Malasartes acordou a velha, e pediu-lhe as botijas
de azeite. A velha foi buscá-las, e, achando-as quebradas, disse:
“Pedro, as galinhas quebraram as botijas e derramaram o azeite.” —
“Não quero saber disso, disse Pedro; quero para aqui meu azeite, senão
quero três galinhas.” A velha ficou com medo, deu-lhe as três galinhas.
Malasartes partiu e foi à noite à casa de outra velha; pediu rancho e
que agasalhasse aquelas três galinhas entre os perus. A velha, como
tola, consentiu. Alta noite, Pedro se levantou, foi ao quintal, matou as
três galinhas, besuntando de sangue os perus. No dia seguinte, bem
cedo, acordou a velha, pedindo as suas galinhas, porque queria seguir
viagem. A velha foi buscá-las e encontrou o destroço; voltou aflita,
contando a Malasartes. Ele fez um grande barulho até levar seis perus
em troca das galinhas. Na noite seguinte, foi ter à casa de um
homem que tinha um chiqueiro de ovelhas, e pediu-lhe para passar
a noite em sua casa e que lhe agasalhasse aqueles perus lá no chiqueiro das ovelhas, porque bicho com bicho se acomodavam bem. O
homem assim fez. Tarde da noite, Pedro foi ao logar onde estavam os
perus, e matou-os a todos labreando de sangue as ovelhas. Pela manhã
levantou-se bem cedo e pediu ao dono da casa os seus perus. O
homem indo-os buscar achou-os mortos, e voltou muito aflito, dizendo:
“Pedro, não sabe? As ovelhas mataram os seus perus.” Ouvindo isto,
Malasartes fez um grande espalhafato, gritando que o homem tinha
morto os perus do rei e recebeu seis ovelhas pelos perus. Largou-se,
indo dormir na casa de um homem que tinha um curral de bois. Aí
ele fez as mesmas artimanhas, até pegar seis bois pelas seis ovelhas.
Mais adiante, ele encontrou uns vendilhões de ouro e trocou os bois
por ouro. Mais adiante encontrou uns homens que iam carregando
uma rede com um defunto. Pedro perguntou quem era, disseram-lhe
que era uma moça. Ele pediu para ir enterrá-la e eles deram. Logo
que os homens se ausentaram, ele tirou a moça da rede, encheu-a de
bastante ouro e enfeites, e foi ter com ela nas costas à casa de um homem
rico que havia ali perto. Pediu rancho, e disse às filhas do tal
homem que aquela era a filha do rei que estava doente, e ele andava
passeando com ela, e pediu que a fossem deitar. Foram levar a moça
para uma camarinha indo Malasartes com ela, dizendo que só com ele
ela se acomodava. Deitou a moça defunta na cama e retirou-se, dizendo
às donas da casa: “Ela custa muito a dormir, ainda chora como
se fosse uma criança, quando chorar metam-lhe a correia.” Alta noite,
Pedro foi e se escondeu debaixo da cama onde estava a morta e pôs-se
a chorar como menino. As moças da casa, supondo ser a filha do rei,
deram-lhe muito até ela se calar, que foi quando Pedro se calou. Depois
ele escapuliu e foi para seu quarto. De manhã ele pediu a moça,
que queria ir-se embora. Foram ver a filha do rei, e nada de a poderem
acordar. Afinal conheceram que estava morta, e vieram dar parte a
Malasartes. Ele pôs as mãos na cabeça, dizendo: “Estou perdido; vou
para a forca; me mataram a filha do rei!. . . ” Os donos da casa ficaram
muito aflitos, e começaram a oferecer coisas pela moça, e Pedro sem
querer aceitar nada, até que ele mesmo exigiu três mulatas das mais moças e bonitas. O homem rico as deu, e Pedro disse que dava uma
desculpa ao rei sobre a morte de sua filha, e lhe dava de presente as
três mulatas, para o rei não se agastar muito. Malasartes largou-se
e foi logo para palácio, onde entregou ao rei as três mulatas com este
dito: “Eu não disse a Vossa Majestade que lhe dava três mulatas pelas
três botijas de azeite? Aí estão elas.” O rei ficou muito admirado.
Entrou por uma porta,
Saiu por outra;
Manda o rei, meu senhor,
Que me conte outra.
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