Nicholas Coppi*
Em tempos de notoriedade para o processo de transição de governo, com ampla cobertura no noticiário nacional, também é necessário trazer à discussão a proposta do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, sobre a correção da tabela do Imposto de Renda de Pessoa Física. Veiculada durante a campanha eleitoral, a ideia consiste em ampliar a faixa de isenção do IR para quem ganha até R$ 5.000. Hoje, o limite é de R$ 1.903,98, valor sem atualização desde 2015. Mas o que isso representa, de fato, para o contribuinte brasileiro?
Esta não é uma pergunta de pronta resposta e carece de reflexões e ponderações.
Atualmente, a tabela do Imposto de Renda prevê isenção para quem ganha até R$ 1.903,98. De acordo com o rendimento do contribuinte, a alíquota é definida em quatro faixas, de 7,5% a 27,5%. O maior valor, neste caso, alcança quem recebe a partir de R$ 4.664,68.
O brasileiro, na prática, perde poder de compra com a cobrança do Imposto de Renda. Basta considerar que em 2015, último ano em que houve correção da tabela, o salário mínimo era de R$ 788, enquanto hoje é de R$ 1.212. Há sete anos, quem recebia dois salários (R$ 1.576) era isento de IR.
Hoje, com dois salários mínimos (R$ 2.424), o contribuinte arca com o pagamento do imposto, e se a tabela não for corrigida, quem recebe um salário mínimo e meio (R$ 1.947, com base na correção prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO - Lei 14.436, de 1922) já deverá pagar o imposto no próximo ano, configurando nítida regressividade, já que os mais pobres pagam mais IR do que os mais ricos, proporcionalmente às suas respectivas rendas.
De acordo com a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco), a tabela do IR, considerando-se a inflação acumulada de 1995 a setembro deste ano, precisaria ser corrigida em 146,6%, de modo que a quantidade de pessoas isentas do tributo saltaria de 7,626 milhões para 24,547 milhões.
Se concretizada a proposta do presidente eleito, uma grande parcela da população brasileira estaria isenta do pagamento de IR. O impacto mais imediato da medida seria uma queda na arrecadação, algo em torno de R$ 194 bilhões. E o governo, necessariamente, precisaria propor novas formas de compensá-la.
Embora o presidente eleito não tenha feito propostas objetivas de compensação, citando genericamente a tributação dos mais “ricos”, tributaristas e economistas de todo o país vêm apontando medidas para atenuar o impacto orçamentário de uma eventual atualização da tabela do IR.
Em se tratando de medidas relativas ao próprio IR, dentre as ideias sugeridas pelos especialistas estão a instituição de alíquotas mais elevadas para faixas maiores de renda, a limitação de deduções com despesas médicas para determinadas faixas de renda, bem como ajustes na sistemática do lucro presumido para os casos de empresas optantes pelo regime.
Também se fala muito no retorno da tributação sobre a distribuição de lucros. O tema inclusive, é objeto do Projeto de Lei nº 2.337/21 que já foi aprovado na Câmara dos Deputados e aguarda discussão no Senado. Outra contramedida aventada pelos estudiosos do Direito Tributário é que o Governo busque um aumento na tributação da renda com redução na tributação do consumo.
Por fim, há quem defenda atualização da tabela do IR no bojo de reforma tributária ampla, o que torna a solução mais complexa do ponto de vista técnico-tributário e político.
Sem dúvida, recolocar a reforma tributária em pauta é questão de urgência. Isso porque o sistema tributário do País necessita de simplificação e organização como forma de diminuir institucionalmente a carga dos impostos. Neste processo, é fundamental que as questões envolvidas na tributação passem por modernização para que problemas de natureza econômica e social sejam corrigidos.
No atual cenário político, a reforma tributária tem uma função conciliadora. Como mecanismo permite honrar compromissos sociais e manter a responsabilidade fiscal, colaborando para a criação de novos negócios e a geração de empregos.
* Nicholas Coppi é advogado, especialista (IBET) e mestre em Direito Tributário (PUC/SP). Professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
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