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sexta-feira, 7 de julho de 2023

Comentários sobre o texto final da reforma tributária aprovado na Câmara

Warren Rena | Política Fiscal 07/07/2023
(Felipe Salto, Josué Pellegrini e Fernanda Castro)


Felipe Salto - economista-chefe Warren Rena



Os aspectos principais da reforma tributária aprovada pela Câmara em dois turnos (restando para hoje apenas a apreciação de destaques) continuaram os mesmos no texto final em relação ao veiculado no dia 5 de julho. A seguir, comentaremos os temas centrais, destacando eventuais particularidades e pontos de atenção.


IBS e transição do ICMS e ISS


O IBS será instituído com alíquota de 0,1% já em 2026. Até 2028, conviverão ICMS, ISS e IBS, sem quaisquer modificações nas alíquotas dos dois primeiros tributos, respectivamente, de responsabilidade estadual e municipal. A partir de 2029, começam a ser reduzidas as alíquotas do ICMS e do ISS, à razão de 10% ao ano, até 2032.
 

Em paralelo, as alíquotas do IBS serão calibradas, entre 2029 e 2032, para preservar a arrecadação em relação a um cenário de referência calculado pelo TCU, com alíquotas sendo fixadas pelo Senado Federal, também a partir de subsídios do Conselho Federativo e dos entes federados.
 

Assim, ao final de 2032, o ICMS e o ISS apresentarão alíquotas equivalentes a 60% das atuais. Isso representa elevado risco para a transição da tributação ao destino, por meio do IBS, uma vez que a alíquota dos antigos impostos ainda será elevada, dificultando a extinção dos impostos prevista no artigo 21 da PEC 45.
 

A saber, a migração da tributação do consumo para o destino das operações, quando se trata de transações interestaduais, só acontecerá em 2033, desde que a transição acima explicada se concretize da forma estipulada. Até lá, remanescerão os mesmos e conhecidos problemas do ICMS, principalmente, e há ainda um risco adicional. Trata-se do fato de as alíquotas elevadas para o tributo, até 2032, ensejarem eventual continuidade da política de concessão de incentivos e benefícios tributários.
 

Não há, na PEC, proibição explícita a esse respeito. A propósito, uma das novidades do texto final aprovado ontem, dia 6 de julho, é a introdução do artigo 20, que permite a criação de “contribuição sobre produtos primários e semielaborados para investimento em obras de infraestrutura e habitação”. Isso significa que os fundos em vigor no bojo do ICMS poderão ser recriados, em paralelo ao IBS, e mantidos mesmo após o período de transição, até 2043.
 

CBS


A CBS, por sua vez, será estabelecida em 2026 com alíquota de 0,9%. Em 2027, o PIS e a Cofins serão extintos, dando lugar a uma CBS com alíquota cheia, a ser calculada pelo TCU e fixada pelo Senado Federal, mas sem interferência, neste caso, do Conselho Federativo.
 

O Conselho Federativo e sua governança


O texto final trouxe inovações a respeito do Conselho Federativo, que será um órgão com amplos poderes, no âmbito do novo IBS, para: arrecadar, normatizar, regulamentar, ter iniciativa de lei complementar, partilhar recursos entre os entes federados e devolver créditos aos contribuintes. Substitui-se, claramente, o papel exercido hoje pelas administrações tributárias estaduais e municipais na gestão dos seus respectivos tributos.
 

As inovações referem-se à governança. O Conselho Federativo terá 27 representantes dos Estados e Distrito Federal; 14 representantes eleitos pelos municípios; e outros 13 representantes eleitos também pelos municípios, mas considerando-se ponderação por número de habitantes.
 

O Conselho vai tomar decisões assim: por maioria absoluta dos 27 representantes, desde que com mais de 60% em termos de população do país; e por maioria absoluta dos 27 representantes dos municípios. Aparentemente, esta foi a forma encontrada para contemplar estados como São Paulo, em que pese a proposta original do Estado ter sido a de substituir o órgão por um mecanismo de câmara de compensação.
 

Fundos de Desenvolvimento e de Incentivos


Permaneceram no texto os dois fundos, com recursos que poderão chegar a R$ 32 bilhões, no caso do Fundo de Compensação dos Incentivos do ICMS, e a R$ 40 bilhões, no caso do Fundo de Desenvolvimento Regional. O Fundo dos Incentivos começará com R$ 8 bilhões, em 2025, sempre aportados pela União, e chegará a R$ 32 bilhões em R$ 2029, diminuindo a R$ 8 bilhões até 2032.
 

O Fundo dos Incentivos servirá para compensar a redução dos incentivos do ICMS, dada a transição do ICMS para o IBS. Ocorre que os recursos já serão aportados, como se vê, a partir de 2025, mas a transição para o IBS só começará em 2029 (ponto de máximo de recursos aportados). Além disso, o parágrafo 8º do artigo 12 determina que: “§ 8º A União deverá complementar os recursos de que trata o § 1º em caso de insuficiência de recursos para a compensação de que trata o § 2º”. Trocando em miúdos, a União será sempre obrigada a aportar tantos recursos quanto forem necessários, mesmo que superem as previsões acima descritas, mediante a comprovação de existência de benefícios regulares a serem compensados que superem os recursos originalmente aportados no Fundo de Incentivos.
 

Assim, não só a transição para o destino está comprometida, como mostramos no item anterior, como também o fundo terá custo fiscal elevado e provavelmente superior ao indicado. Mais do que isso, a lógica de incentivos distorcivos, que era justamente um ponto a ser combatido pela reforma, ainda remanescerá por bom tempo.


O FDR, por sua vez, começará com aportes de R$ 8 bilhões, pela União, em 2029, e atingirá R$ 40 bilhões em 2033. Ele será mantido mesmo após esse período. Seu objetivo liga-se a questões de infraestrutura, de modo geral, conforme estabelecido no artigo 159-A proposto pela PEC 45.
 

Exceções às alíquotas gerais


Foram ampliadas as exceções às alíquotas gerais, de modo que a tendência é a alíquota de referência acabar mais alta do que a prevista inicialmente pela equipe econômica (25% para a combinação de IBS e CBS). Além disso, o redutor, antes de 50%, agora será de 60%. Lei complementar vai pormenorizar as exceções. Este é um problema grave do texto final, uma vez que fere a lógica do IVA com alíquota uniforme no destino.


Cesta básica e devoluções


A lógica da desoneração da cesta básica, agora, parece combinar duas frentes: a redução a zero das alíquotas e a possibilidade de devolução (o chamado cashback). A redução a zero significará um benefício similar ao atual, isto é, para toda a população. A diferença é que a cesta básica será fixada por lei complementar, homogeneizando a sua composição para o país todo. Mesmo assim, remanesce a possibilidade de conceder as devoluções para população de baixa renda, o que será regulamentado por lei posterior.


Comentários gerais, dificuldades e riscos


Nossa avaliação geral sobre o texto aprovado permanece a mesma que tem sido veiculada aos clientes da Warren Rena ao longo deste ano. Entendemos que os princípios da não cumulatividade e do destino, além da simplificação, são corretos e devem ser buscados. No entanto, entendemos que as exceções colocadas no texto, a transição mal calibrada, a governança do imposto (por meio do Conselho Federativo), a preservação dos incentivos do ICMS por meio de subsídios (com o Fundo de Compensação de Incentivos do ICMS), dentre outras dificuldades que ficaram para tratamento por leis complementares, colocam um viés negativo sobre o resultado final. O Senado Federal ainda poderá fazer modificações ou mudar o rumo das discussões e da apreciação do texto que sairá da Câmara, mas isso será tempestivamente analisado a partir das avaliações da nossa área de Análise Política.
 


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