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domingo, 26 de abril de 2020

Justiça Federal do RN segue entendimento do MPF e Governo Federal deve se abster de exaltar golpe de 1964

Decisão liminar em Ação Popular deliberou pela exclusão da “ordem do dia alusiva ao 31 de março de 1964” do site do Ministério da Defesa



Justiça Potiguar - A 5a Vara da Justiça Federal no Rio Grande do Norte emitiu, nesta sexta-feira (24), decisão liminar que determina a retirada da “ordem do dia alusiva ao 31 de março de 1964” do site do Ministério da Defesa. O documento, assinado pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e pelos comandantes das Forças Armadas, exalta o golpe de Estado de 1964 como um “marco para a democracia brasileira”. O Ministério Público Federal (MPF) já havia emitido parecer a favor da exclusão do conteúdo, entendimento seguido pela decisão judicial. A retirada do conteúdo é objeto de Ação Popular proposta pela Deputada Federal Natália Bonavides, do Rio Grande do Norte. A ação pede, ainda, que o Governo Federal se abstenha de divulgar qualquer conteúdo em comemoração à data.

De acordo com a liminar, “a ordem do dia prega, na realidade, uma exaltação ao movimento, com tom defensivo e cunho celebrativo à ruptura política deflagrada pelas Forças Armadas em tal período, enaltecendo a instauração de uma suposta democracia no país, o que, para além de possuir viés marcantemente político em um país profundamente polarizado, contraria os estudos e evidências históricas do período.” Foi concedido prazo de cinco dias para cumprimento da decisão.

É o que ressaltou o procurador da República Camões Boaventura, ao afirmar que “toda e qualquer iniciativa estatal de celebrar o regime ditatorial, minimizar a gravidade do período ou reescrever a história, além de contrariar o texto constitucional e o sistema protetivo internacional de direitos humanos, é contraditória com reconhecimentos e confissões anteriores do Estado brasileiro. Trata-se de uma reiteração de graves lesões às vítimas diretas do regime, a elas impondo novos sofrimentos.”

Para a juíza Federal autora da decisão, “nos termos do pronunciamento do MPF nestes autos, a promulgação da Lei nº 12.528/2011, que instituiu a Comissão Nacional da Verdade, e cujo relatório final foi enfático em atestar milhares de mortes e violações de toda ordem durante o período investigado, referindo-se ao dia 31 de março de 1964 como um golpe em face da democracia até então vigente”.

A decisão destaca, ainda, que “tal como esposado pelo MPF em seu parecer, a utilização de um portal eletrônico oficial de um órgão do Executivo federal para enaltecer o golpe de 1964 desvia-se das finalidades inscritas no atual texto constitucional, que rechaça regimes autoritários, sobreleva os direitos humanos e exige caráter educativo e informativo da publicidade institucional”. Além disso, a liminar também afirma que a “ordem do dia” contraria a Lei 12.345/2010, que exige consultas e audiências públicas e aprovação de projeto de lei para estipulação de datas comemorativas no país.


Escalada autoritária

No parecer, Camões Boaventura destacou que o texto no site do Ministério da Defesa não é um ato isolado, mas representa a escalada de práticas estatais autoritárias observadas no país, que demandam “uma atuação rápida e enérgica do Poder Judiciário”. Em 2019, a Justiça Federal proibiu comemorações dos 55 anos da tomada de poder pelos militares, que haviam sido determinadas pela Presidência da República. De acordo com o procurador, a “ordem do dia” promove reiteração da prática abusiva e é necessário que a proibição não se atenha ao ano de 2020, mas seja permanente, para “expurgar de vez do imaginário estatal nacional celebrações desse viés”.

O procurador defende que “a reprodução da herança colonial e autoritária pelas instituições nacionais” deve ser combatida com “uma política de Estado, não de governos específicos, e para tanto se faz necessário o desenvolvimento de uma pedagogia pela cidadania que reflita sobre o passado, realize direitos e reinvente as instituições”.

A decisão judicial vai ao encontro desse entendimento, ao afirmar que deve prevalecer “o direito fundamental à memória e à verdade, na sua acepção difusa, com vistas a não repetição de violações contra a integridade da humanidade, preservando a geração presente e as futuras do retrocesso a Estados de exceção”. 


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