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quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Revisão da Vida Toda: voto de Rosa Weber recompensa desídia do INSS

 

Foto: Murilo Aith


Murilo Gurjão Silveira Aith*


 

No último dia 21 de agosto, findou-se a pauta de julgamento do Tema nº 1.102 (Revisão da Vida Toda) do Supremo Tribunal Federal, onde o juiz Zanin requereu vista e possui prazo de 90 dias corridos para devolver os autos, sendo importante rememorar que, com ou sem o seu voto, o julgamento será retomado após o decurso deste interregno.

 

Em razão da proximidade de sua aposentadoria, a Presidente do Pretório Excelso, juíza Rosa Weber, mais uma vez, cumprindo seu dever republicano e de cordialidade que lhe é presente, antecipou sua decisão e divergiu em parte do voto-condutor proferido pelo juiz Alexandre de Moraes.

 

Diga-se de passagem, o voto proferido pela juiz esclarece vários pontos obscuros das questões tratadas e aperfeiçoa o voto do Juiz Moraes, divergindo, no entanto, quanto ao termo inicial para o pagamento dos atrasados.

 

Em seu entendimento, a juíza esclarece que, por razões de segurança jurídica, os jurisdicionados que ingressaram com a ação antes de 26/09/2019 (data do início do julgamento de mérito do REsp 1.554.596/SC – Tema nº 999 do STJ), receberão as parcelas quinquenais ao ajuizamento. Aos que propuseram as ações após a referida data, receberão somente a partir de 17/12/2019 (data em que o acórdão foi publicado pelo STJ).

 

Segundo a juíza, a alteração jurisprudencial que autoriza a modulação ocorreu apenas no Superior Tribunal de Justiça, e não no STF, daí sua delimitação quanto ao marco temporal.

 

Ocorre, contudo, que a juíza, acidentalmente e com todo o respeito que ela merece, acaba violando a isonomia e, além de distorcer os mais comezinhos princípios do Direito Previdenciário, acaba recompensando a antijuridicidade cometida pelo INSS ao longo de duas décadas.

 

É importante mencionar que, embora tenha se posicionado de forma favorável, a juíza se esqueceu da vontade do legislador ao autorizar a aplicação da regra permanente (art. 29, I e II da Lei n.º 8.213/91) em detrimento à regra de transição do artigo 3º da Lei n.º 9.876/99. Em virtude da alteração radical na forma de cálculo dos benefícios, o legislativo considerou a necessidade de se evitar prejuízos aos segurados que já eram filiados à previdência – com largo período básico de cálculo – e introduziu a regra transitória para proteger os trabalhadores que já estavam próximos da aposentadoria (e, evidentemente, poderiam ter seus benefícios reduzidos pelas novas alterações nas formas de cálculo, fixando a competência de julho de 1994 para a utilização dos salários contributivos).

 

O caráter de transitoriedade da norma mencionada acima (art. 3º da Lei n.º 9.876/99) é patente, pois o próprio artigo considera a limitação temporal e reconhece a perda de sua utilidade no momento em que os segurados filiados ao RGPS antes da edição da referida Lei deixarem de existir.

 

É ainda, em decorrência do caráter transitório, que não poderia o art. 3º da Lei nº 9.876/1999 ser interpretado de modo a prejudicar segurados que já possuíam duradoura e regular trajetória contributiva antes de sua edição, devendo ser facultado ao segurado a escolha pela aplicação da norma que lhe é mais vantajosa (no caso, a regra permanente) – trata-se daquilo que denominamos de “princípio do direito ao melhor benefício.

 

Nessa toada, reconhecendo a possibilidade do segurado que tenha ingressado no RGPS em momento anterior à edição da Lei nº 9.876/99 optar pela aplicação da regra permanente do art. 29, I da Lei da 8.213/99, o STJ firmou sua tese sob o manto dos recursos repetitivos, por ocasião do deslinde do Tema nº 999 (onde se reconheceu o direito integral dos segurados). T

 

Visando fulminar toda e qualquer controvérsia, o STF seguiu o mesmo entendimento do STJ (afinal, não há outra alternativa, é um direito assegurado por lei dos aposentados) e julgou pela aplicação da regra permanente discutida, quando mais favorável que a regra transitória. Noutros termos, mais uma vez, a metodologia de cálculo do art. 29 da Lei nº 8.213/91 foi chancelada, porquanto em Plenário prevaleceu o entendimento de que, havendo prejuízos para o segurado, é possível afastar a regra de transição introduzida pela Lei que exclui as contribuições anteriores a julho de 1994.

 

No entanto, estamos diante de um verdadeiro imbróglio em que o INSS, mais uma vez, pretende lucrar em cima da parte mais frágil (não estão tirando de ricos, mas de pessoas idosas que passam extremas necessidades em virtude de idade avançada, onde há elevados gastos com medicamentos e tratamentos para assegurar o mínimo de qualidade em suas vidas), pois abafou de forma sorrateira o direito assegurado pelo Legislativo durante duas décadas e ainda provoca danos marginais nos processos até o presente momento (praticando atos meramente protelatórios e induzindo os julgadores ao erro com dados falsos, sem qualquer tipo de punição).

 

A covardia da autarquia pode estar sendo premiada, agora, com uma modulação dos efeitos financeiros, sendo que a presente revisão já nasce modulada por conta da prescrição e decadência. Muitos (para não dizer a maioria) dos aposentados já estão no prejuízo – seja por não poder ingressar com a ação em razão da decadência ou por conta da própria prescrição – e, modular fixando o marco temporal dessa forma (com pagamento dos atrasados somente a partir da publicação do acórdão) aumentará ainda mais os prejuízos aos segurados.

 

A segurança jurídica está começando a ser esquecida, não pode o Supremo permitir ser induzido por inverdades da autarquia e desviar-se de seu foco de resguardar o bem maior: a Constituição Federal. Estamos tratando do beabá, a regra já passou pelo legislativo, a interpretação é mais do que adequada, não há sentido em restringir ainda mais o direito dos jurisdicionados que, diga-se de passagem, são pessoas idosas e que foram demasiadamente prejudicadas pelo próprio órgão que jurou protegê-las na idade avançada. Permitir que isso aconteça aumentará ainda mais o descrédito que a autarquia já possui, esse é o tipo de conduta que, cada vez mais, desestimulará todas as gerações supervenientes a não confiarem no Estado Democrático de Direito. Isso, aliás, afeta a própria segurança jurídica “defendida” na modulação proposta pela Eminente juíza.

 

Ainda restam 9 (nove) juízes para votar, estamos confiantes de que os remanescentes honrarão a Casa e não permitirão quaisquer prejuízos aos trabalhadores/segurados.

 

*Murilo Gurjão Silveira Aith é advogado de Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados




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